sábado, 11 de julho de 2009

Famílias em férias...


Andamos no stress da vida, corre-corre do trabalho, lufa-lufa da casa e filhos e compras, corpo aqui no rame-rame do que tem de ser feito, cabeça ali nas preocupações do ontem e do amanhã, coração a turbo para acabar o dia antes de o dia ter acabado… E caímos nas férias, subitamente, sem aviso prévio, malas abertas num qualquer sítio, vazia das rotinas que nos asseguravam não termos de estar presentes. E, ao lado, o marido ou mulher, esse desconhecido com quem jantámos apressados durante um ano. E os filhos, diferentes, agora que o eixo de comunicação primário da escola é substituído por dias integrais de relação pura e abrangente.

E nesta re-descoberta da família que acreditávamos tão conhecida, escondem-se problemas típicos do reencontro com realidades que se modificaram, o que origina alguns desafios em plenas férias.

Se a distância, distancia, o que acontece às relações conjugais que se sustêm nos monossílabos de todo um ano feito de trivialidades? Nas férias, com frequência, esses milímetros diários de distanciamento tornam-se aparentes e descobrem-se quilómetros nem sempre fáceis de serem percorridos. E surgem discussões, blocos de gelo no meio do calor da praia, pequenas irritações, uma angústia insidiosa a propósito do futuro e da pertinência da relação.

E os filhos que demonstram hábitos que desconhecíamos, traços de personalidade que nos deixam na dúvida se exigem ser educados ou criar espaço para o seu desenvolvimento: preocupo-me ou congratulo-me pela sua maturação? E nós, que prevíamos um descanso isento de preocupações…

Estes desafios que se intrometem no espaço descuidado das férias são relativamente frequentes e, apesar de exigirem algum trabalho relacional da nossa parte, bom senso e calma, podem representar momentos importantes de crescimento pessoal e da relação. Apenas há que tomar cuidado em não extremar posições, em conter a impulsividade natural (sobretudo para quem ainda está sob o efeito do desgaste de um ano de trabalho), o confronto e a reactividade emocional excessiva.

Algumas sugestões para quando o clima aquecer aí em casa, em plenas férias:


  • Antes de reagir, imponha a si próprio uns minutos de arrefecimento; vá passear um pouco, dar um mergulho ou fazer um lanche. Se não for um tema que exija reacção da sua parte no próprio dia, opte por consultar o travesseiro: existe muita reorganização interna durante o sono e é frequente acordarmos com a resolução de problemas que na véspera nos pareciam insolúveis.

  • Pense que qualquer dificuldade relacional é, de facto, uma excelente oportunidade para descobrir novos pontos de contacto e fazer crescer a relação; puxe pela sua criatividade e competências de resolução de problemas e tente encontrar uma forma de o fazer.

  • Lembre-se que os seus filhos tiveram um ano para se definirem mais enquanto pessoas e têm de ensaiar comportamentos da nova fase de desenvolvimento em que estão até estabilizarem no seu crescimento. Opte por ouvir, antes de reagir; por observar com atenção e perguntar, antes de dizer o que pensa e o que permite; por se estabelecer como um parceiro de confiança, capaz de negociar, do que como alguém que estabelece regras unilaterais.

  • Se as dificuldades se mantiverem, após as férias, considere um acompanhamento especializado (terapia conjugal e familiar), que sirva como mediador neutro e catalizador de mudanças positivas.

Quando o corpo é o inimigo


A ansiedade é uma reacção intensamente corporal e que foi “desenhada” para ser desagradável ao ponto de nos chamar a atenção, porque tem por função alertar-nos para potenciais perigos. Assim, muita da reacção ansiosa é sentida ao nível do corpo: aceleração cardíaca, tensão muscular, digestões difíceis, alterações da temperatura corporal, hiperventilação, com as suas consequências de sensação de sufoco, dor no peito e tontura… tudo sintomas físicos comuns de quem está ansioso.

No Verão, devido ao calor, o corpo adapta-se às novas condições externas e reage, igualmente, com alguns destes sintomas, muito particularmente a sensação de dificuldade em respirar, e digestões que, pelo menos, nos parecem ser mais lentas, bem como algumas dificuldades de sono que nos deixam combalidos durante o dia.

No Verão, quem tenha predisposição para problemas ansiosos (o que acontece às pessoas com um limiar mais baixo para reconhecerem a sintomatologia física e com uma menor tolerância a esses sinais do organismo), passa por alguns maus momentos. O corpo dá sinais de ajuste à nova temperatura e uma pessoa com maior predisposição para a ansiedade sente com maior intensidade esses sinais e preocupa-se a um ponto de ficar ansioso o que, por sua vez, gera sinais muito parecidos. Desta forma, a sintomatologia física intensifica-se e a pessoa sente que existe, de facto, motivo de preocupação, sendo frequente pensar que existe algum problema médico grave e que requeira atenção urgente.

Nos casos extremos do que acabámos de falar, nomeadamente quando surgem picos de ansiedade muito elevados, a um ponto de a pessoa ter uma sensação de morte ou descontrolo eminente, e quando se instala um ciclo de preocupação a propósito de poder voltar a sentir a mesma coisa, define-se como perturbação do pânico.

Trata-se de uma das perturbações da ansiedade mais frequentes e muito penalizadoras da qualidade de vida porque origina muito sofrimento, a que parece ser impossível de escapar, porque o inimigo é o corpo, com os seus sinais de alarme. Felizmente, existem metodologias de tratamento muito eficazes em psicologia para esta situação.


  • Algumas sugestões, no caso de se dar mal com o calor e já se ter apercebido de que fica ansioso(a) com as suas reacções corporais:

  • Em primeiro lugar, proteja-se do calor excessivo, ficando dentro de casa à hora de maiores temperaturas e economize-se no esforço físico

  • Aligeire as refeições, muito em particular o almoço, diminuindo as doses (e compensando com uma maior frequência) e evitando comidas indigestas e pesadas
  • Mantenha-se hidratado e longe do sol forte

  • Aprenda um exercício de respiração abdominal que lhe permita restabelecer rapidamente um ritmo correcto de respiração e, assim, evitar a sensação de sufoco que caracteriza a hiperventilação, que surge como um dos primeiros sinais de ansiedade

  • Faça exercício físico nas alturas em que o tempo está mais fresco (de preferência, de manhã cedo)

  • Mantenha o quarto de dormir tão fresco quanto possível, para que o corpo possa arrefecer à noite, ajudando a um sono repousado

  • Quando sentir o corpo a dar sinais de desconforto, lembre-se que ficar ansioso apenas vai piorar esse desconforto

  • Finalmente, nunca é demais lembrar: se tiver motivos para pensar que possa ter um problema físico, não hesite em fazer uma avaliação médica!

  • E, se suspeitar que possa sofrer de perturbação do pânico ou de outro problema de ansiedade, tenha presente que é uma situação que se trata com elevados níveis de eficácia em psicoterapia.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

O lado lunar das férias

Com o Verão vem a luz que nos anima a planear pequenas escapadelas aos tons cinzentos que o nosso dia-a-dia tende a escolher. E as férias com promessas de evasão, de descanso e de despreocupação, como um breve intervalo em tudo aquilo que nos desagrada. O que raramente nos lembramos é que, com o Verão e as férias também surgem algumas complicações e que convém precavermo-nos e, sobretudo, estar prevenidos para lhes podermos reagir.

Uma dessas complicações resume-se na palavra “stress” que nos ajuda a agregar reacções tão diversas como irritabilidade, falta de atenção e concentração, dificuldades de memória, volatilidade de humor ou um tom mais depressivo, uma sensação de alerta permanente, impulsividade de decisões, desmotivação… A lista é elevada e, a inaugurar esta época surge um pico de stress, por três efeitos: o do acumular do cansaço, a reacção do organismo quando nos apercebermos de que há um fim à vista para o esforço sustentado de vários meses e o próprio stress de planificar e decidir férias.

Enquanto que o primeiro dispensa apresentações, já o facto de termos uma quebra de energia só por sabermos as férias próximas é aparentemente paradoxal. Bem, imagine que todo o seu organismo é capaz de conversar: você dir-lhe-ia que já falta pouco para poder descansar; ele responder-lhe-ia: “ufa, então já posso começar a desmobilizar parte da energia que tenho vindo a reunir”. No esforço elevado, estamos sustentados por todo um contexto fisiológico que tem por fim permitir-nos cumprir com os nossos objectivos – quando damos a ordem de desmobilizar (o que acontece, frequentemente, por antecipação, como quando nos começamos a imaginar de férias), subitamente apercebemo-nos de falta de energia e uma dificuldade elevada em percorrer o resto do caminho até às férias.

Decidir, planear e gerir os vários detalhes envolvidos nas férias pode, igualmente, ser uma fonte acrescida de stress, algo mais para fazermos adicionalmente a todas as outras que não são opcionais.

E, com o calor, o corpo reage num esforço de adaptação a um novo ambiente externo, produzindo sintomas físicos que, para quem tenha tendência a uma reactividade ansiosa, podem ser assustadores e fazer desencadear fortes picos de ansiedade. Nalgumas situações, podem mesmo instalar-se perturbações ansiosas que requerem acompanhamento psicológico, como é o caso da perturbação do pânico.

Um outro factor importante nas férias e que pode criar alguma sensação de desequilíbrio são as alterações relacionais no contexto familiar que ocorrem com alguma frequência; ou, melhor dizendo, o facto de se tornar aparente, por força do convívio, as distâncias que se foram cavando ao longo de todo um ano de pressa e de preocupação com as obrigações quotidianas.

E quando as férias estão na fase da despedida, também ocorrem alguns fenómenos específicos. Entre a melancolia de quem sabe que tudo vai ser retomado e muita dessa realidade é desagradável e a vontade de introduzir modificações à forma como se leva a vida, abre-se um espaço de reflexão que, bem aproveitado, pode fazer toda a diferença no que diz respeito ao nosso bem-estar e auto-satisfação.

Após o descanso, surgem um momento privilegiado: as cartas da mudança estão na nossa mão! Queremos mesmo assumir uma nova perspectiva sobre a vida e implementar alterações que nos permitam percorrê-la na direcção que acreditamos ser a mais adequada para nós? Malas desfeitas, no regresso a casa, talvez seja tempo de iniciarmos uma nova viagem, um pouco diferente.
Foto de Luis Rocha dos Reis, Studio4u